7 de abril de 2012

III

    Depois daqueles minutos abraçados em que lhe dei todo o meu apoio, para que ela ficasse um pouco melhor ela foi tomar um banho. Parece que não vim a Almada em vão, ela precisava mesmo de mim. Foi estranho para mim, pois nós não temos uma cumplicidade grande, somos apenas conhecidos. Mas, é óbvio que tenho a plena consciência que ela me vê mais que um simples conhecido, um simples rapaz com barba de três dias, um simples rapaz que estuda medicina, ela vê-me como o TAL.

- Vou-me vestir, e vamos lá. A visita é as 17:00m, temos uma hora. - disse-me enquanto passava da casa de banho até ao quarto enrolada numa toalha.
- Ok... - fiquei estupefacto.

 *   *    *


- Estou pronta. - disse-me ela.

Ela nem parecia a mesma já tinha um aspecto mais saudável. Tinha um vestido branco e uns acessórios que a tornavam ainda mais bonita do que já era. Ela esmerou-se para me surpreender. Ou não... Não é o momento nem o tempo especial para essas coisas, o Ricardo estava preso a uma cama de hospital com um destino em aberto. 

- Vamos? 
- Sim, bora. - saímos os dois pela porta e metemo-nos no elevador e já lá estava gente. Uma loira, com um aspecto horrível, provavelmente uma drogada ou mesmo uma mulher da vida. Mas, ela não era o único individuo que estava no elevador, estava também uma criança que aparentava ter uns oito anos de idade, acompanhada com uma senhora já com os cabelos grisalhos. 
   Fomos até ao piso -1, a garagem. Metemo-nos dentro do Seat Ibiza e logo a sério ela colocou a chave na ignição e o carro ligou, moveu a mão até ao rádio e pôs a tocar uma música do Eminem, nem sabia que ela tinha esse tipo de gosto musical. 

- Gostas de Eminem?
- Não, por isso é que o estou a ouvir. - disse-me sarcasticamente.
- Ah ah ah ah, estás com imensa piada agora.
- É, o banho fez-me bem. Mas, é por pouco tempo.



 Quando chegámos, segui-a até ao quarto do Ricardo. Mas, tivemos que esperar, parece que ele já tinha visitas antes de nós. Eu só pensava : Que não seja a Joana, por favor. Sinceramente eu só pensava nela e como iria ser o nosso reencontro. Tinha várias perguntas sem resposta que me enchiam a cabeça e me prendiam o pensamento. Por vezes, a Matilde olhava-me de relance. Ela estava nervosa, tal como eu, mas por razões diferente. Não sabia que fazer... E nesse instante as pessoas que se encontravam no quarto saíram, eram os pais do Ricardo. A Matilde manteve um dialogo misero e pequeno com eles e depois eles foram à sua vida.

- É agora. - disse-lhe.
- Sim, posso... - olha para a minha mão e eu interrompo-a.
- Claro, porque não? Estamos unidos. - e estávamos de mãos dadas para o pior momento da sua vida.

 Ela com a sua mão esquerda abriu a porta, e logo se ouviu o barulho ensurdecedor das máquinas que fazem com que o nosso batimento cardiaco acelere. Largamos as mãos e ela sentou-se ao lado do Ricardo num pequeno banco, passou a sua mão pela cara dele que tinha alguns ferimentos cobertos por pensos depois a sua primeira lágrima caiu muito lentamente, parece que a ouvi cair, e olhei para a sua cara. Os seus olhos estavam a começar a ficar vermelhos, e enquanto chorava tentava falar com ele como se estivesse acordado: 

- Como estás meu amor? Eu já cheguei, já está tudo bem. - faz uma pausa - Tu estás apenas a dormir. Sabes que te amo ! - ela soluçava cada vez mais, eu pensei que fosse uma má ideia eu estar ali.
- Queres que fique? - perguntei-lhe.
- Ricardo queres que o Salvador fique? - esperou pela sua resposta. - Eu também quero desse jeito. - virou-se para mim - O Ricardo quer que fiques.
- Ok, então eu já volto. Vou apenas buscar um copo de água lá fora. 

  Sai do quarto e senti-me aliviado, de facto que aquilo não era um lugar para mim. Vi tudo a andar para trás, os dias que me matei a estudar, as noites que descombinei para estudar ainda mais, para agora chegar a um hospital e ver o sofrimento que as pessoas têm quando um familiar, um  amigo, um conhecido fica internado. Eu não quero falhar na minha profissão. O meu pensamento foi interrompido:

- Salvador? - ela, com cabelos da cor do ouro, com os olhos da cor da floresta, hipnotizantes. Fiquei sem reacção aquilo que eu temo acaba sempre por acontecer.


Continua.



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