25 de fevereiro de 2012

XXVI

JOANA

   Entrámos no expresso que ainda se encontrava no centro rodoviário e dentro de segundos partimos com um só destino: Lisboa. Eu adoro andar de autocarro já a Sara dorme a viagem inteira, também ronca ás vezes dou por mim a rir com os sons que ela faz durante o sono. Já para não falar das pessoas que também não se conseguem manter firmes para não rirem. Gosto quando o sol me bate na face e parece que ma queima, e me faz brilhar durante toda a viagem. Finalmente, depois de 3 horas de viagem chegamos a Almada. 

Sara: Posso ficar em tua casa? Não quero que os meus pais me façam perguntas.
Joana: Claro que sim, já estava a contar contigo. - faço um sorriso rasgado.

   Assim que avistámos o prédio onde moro, lembrei-me novamente que não tinha respondido á carta do Diogo, espero não o ver tão de pressa porque não sei como o irei encarar. Á medida que ia subindo as escadas, sim, porque o elevador está avariado, recordei-me da despedida à D.Maria que tinha ido embora. Perguntava-me a mim e à Sara quem seria o meu novo vizinho do 3º andar.

Joana: Quem será? - perguntei-lhe.
Sara: Se calhar é um homem todo musculado na casa dos 20, com um cabelo super rebelde...- interrompo-a.
Joana: ... Loiro, com um estilo único, com sotaque inglês e uns olhos hipnotizantes.
Sara: Ou então, um nerd qualquer. - ri.se.
Joana: Esperemos que não. E agora só por acaso era uma rapariga, era da maneira que não haviam chatices.
Sara: Que convencida, Jo.
Joana: É verdade - faço uma pausa.- O problema é que estou demasiado pegada ao Ricardo para pensar noutra pessoa.
Sara: E eu ao T, infelizmente. Mas, esta semana tudo vai mudar.
Joana: Sou uma cobarde.
Sara: Somos duas.
Joana: Fugimos aos problemas, não devíamos. - enfio a chave na fechadura de casa.


   E quando abro a porta  era como se tudo estivesse coberto de uma cor branca. PÓ, sim, estava tudo coberto de pó. E como habitual começo a espirrar e nunca mais paro, sou alérgica ao pó. Já tinha saudades da minha casinha, e assim que entro com as algumas malas abro todas as janelas para a casa apanhar ar depois de algumas semanas estar fechada e ter um cheiro esquisito. Ligo o rádio coloco o volume no máximo e ponho-me a dançar como uma doida, precisava mesmo de descarregar energias. A Sara ao inicio olhou para mim com cara com imensa preocupação mas depois, abriu-se e juntou-se a mim com danças super esquisitas. Ela olhava para mim e ria, eu olhava para ela e ria, o som propagava-se e ouvi a campainha a tocar. Pensei « Boa, vão-me estragar a diversão de uma terça feira de manhã. » Dirijo-me á porta e peço à Sara para baixar o volume da música, abro a porta e fico sem reacção.


Diogo: Voltaste?
Joana: O que fazes aqui? Não me digas que ... - ele interrompa-me.
Diogo: Yup.
Joana: Mas... - volta a interromper-me.
Diogo: Não penses que... - desta vez sou eu que o interrompo.
Joana: Já estou a pensar, Diogo.
Diogo: Mas não é nada disso.
Joana: Então o que é? Explica-te. - disse de um modo rude.
Diogo: Uns dias depois de acabarmos vim até aqui, estava a D. Maria nas escadas e eu comecei a conversar com ela. Ela disse-me que se ia mudar e que o apartamento dela já estava à venda e como eu já esperava encontrar algo assim aqui perto optei por falar com ela e mudar-me para aqui. - fez uma pausa. - Depois também me disse que foste de férias. Não foi intencional.
Joana: Ok, depois falamos. Ciao  - despedi-me apressadamente para que ele não dissesse mais nada, se não as coisas irão complicar.
Sara: Ouvi tudo.
Joana: Sabes que vou fazer tudo para o ignorar, não sabes? Não sei, nem sequer imagino a forma como o encarar depois disto além disso o assunto da carta vai acabar por se ser falado.
Sara: Sei. - disse cabisbaixa.

Continua.

15 de fevereiro de 2012

XXV

Ricardo

   Vejo o bilhete da Joana e da Sara em cima da mesa da cozinha, depois de descer as escadas. Fico de tal maneira transtornado que me dá imensa vontade de dar um soco a alguma coisa, qualquer coisa. A cara do imbecil do gajo que estava com a minha namorada, a Joana, era tentadora mas como tal era impossível e além disso não o iria fazer, não queria por as coisas mais más do que já estavam. No bilhete dizia:

Ricardo e Tiago, nós fomos a Almada dar um bocado de férias das férias que tivemos aí. Voltamos na próxima semana. Desculpem não nos termos despedido, só tínhamos expresso de madrugada, Beijinhos.


   Dirijo-me até à carrinha que estava no passeio mesmo encostada ao murro de casa, ligo-a e arranco em alta velocidade sem olhar para trás. Acho que sei para onde vou mesmo antes de lá chegar. Há um sitio aqui na Zambujeira numa praia perto da que costumo surfar onde há algumas rochas, e nos dias em que há ondulação, tem a onda mais incrível que já vi. Também é um sitio onde podemos levar porrada a sério, pelo menos já vi uns putos a espancar outros. A minha prancha está na parte de trás da carrinha. Dispo-me até ficar de roupa interior e visto o fato que tenho sempre no banco de trás, neste caso estavam lá dois, o meu e o do T. Depois sigo entre as rochas e entro na água, com cuidado para evitar ser derrubado por uma onda. 
   Não existe ninguém a surfar, sou só eu e as ondas mais bonitas que já vi. Não sei porque os problemas que tenho em terra parecem diferentes no mar. Talvez seja o facto de ser tão mais pequeno do que o que me rodeia. Talvez seja por saber que, mesmo que seja derrubado, posso sair e voltar a fazer tudo de novo, ao contrário da vida real. Se nunca surfaram, não consegue perceber a atracção do próprio desporto. De um momento para o outro, aí estou eu e a onda assume o controlo como que por magia. E estou a voar. Estou a voar e, depois  mesmo quando penso que o coração vai saltar do peito, tudo acaba.

  Uma ondulação ergue-se debaixo da minha prancha, viro-me e vejo um tubo a formar-se mesmo atrás de mim. Endireito-me e coloco-me na curva da onda, surfando-a à medida que ela se fecha à minha volta, e depois estou a cair, às cambalhotas, debaixo de água, sem saber onde fica a superfície para vir ao de cima. Chego à superfície, com os pulmões a arder, os cabelos despenteados, e os ouvidos a latejar do frio. Nisto, eu sou mesmo bom. Dou por mim e o sol já se está a pôr é incrível como fiquei a tarde toda aqui. Mas, muito intencionalmente, fico fora de casa até depois do sol se pôr. Enrolo-me numa manta que tinha guardada na parte de trás da carrinha e sento-me à beira das rochas, ver a lua surfar nas ondas. Tenho a cabeça a latejar, dói-me o ombro por causa de uma das grandes quedas que mandei ao longo da tarde e devo ter engolido pelo menos uns quatro litros de água salgada. Nem consigo descrever a sede que tenho, como era capaz de me matar para beber uma cerveja, mas alimentar este vicio está fora de questão, deixou de ser a minha prioridade há alguns meses atrás não quero estragar tudo. Mas, também sei que se entrar na carrinha vou direito a algum bar para beber essa tal cerveja que me está a deixar louco, por isso, fico à espera que maior parte dos sítios encerrem para poder ir para casa. Todas as luzes estão apagadas em casa, o que faz sentido, são quase três da manhã quando estaciono a carrinha. Enfio a chave na fechadura e deixo os sapatos à entrada para não fazer barulho. Vou em direcção à cozinha para beber um copo de água, e vejo-a sentada à mesa como um fantasma.  Tive a sensação de ser a Joana lá sentada à minha espera mas não, era a Matilde. Começamos a falar, uma conversa da treta, ela fez-me lembrar mais que uma vez a Joana a maneira de falar e os gestos que fazia. Sinto-me mal, estou sem ela à um dia e já tenho saudades de a agarrar e beijar, de ter uma noite fantástica como antigamente.

Matilde: Eu sei que a Joana ás vezes consegue ser... bem, ás vezes intimida. Sei que age como ninguém. Não a conheço mas a minha primeira impressão dela foi essa mesmo. - a Matilde põe-se de joelhos e aproxima-se mais, com os cabelos a caírem-lhe para a frente. Encosta uma mão à minha face. Depois beija-me devagar. - Mas eu sempre te amei.

   Quando a Matilde me disse isto, lembrei-me da primeira vez que eu e a Joana fizemos amor. Foi aqui, lá em cima no nosso quarto. Quando chegara ao quarto eu agarrei-lhe e beijei-lhe, sim, beijei-lhe. Agarrei no rosto dela com as mãos e disse-lhe tudo o que nunca pude dizer a ninguém. Agarrei na bainha da sua camisa e puxei-lhe para cima, para que as suas pernas se pudessem enrolar à volta das minhas. Despi a minha t-shirt para que ela pudesse beijar-me o sal nas omoplatas. Deitei-a. Amei-a.

Ricardo: Isto não está certo Matilde. Desculpa, nada do que fizeste e disseste esta correto, eu amo a Joana.



                                                          Continua.


8 de fevereiro de 2012

XXIV

   A raiva percorria o meu corpo todo, numa velocidade inimaginável como quem foge de um cão, neste caso de quem tem medo de cães. O Salvador veio comigo, e parece que já me habituei ao nosso silêncio, talvez não tenha dito nada porque não devia ou tinha um pouco de receio da minha resposta ou até mesmo da minha reacção. Depois de andarmos tanto sem parar, eu decidi parar. Estávamos num descampado, - quando digo isto, lembro de policiais e coisas do género - tudo à nossa volta era verde, árvores enormes e outras mais pequenas, e a erva passava-nos por cima dos tornozelos. Fiquei a contemplar aquela paisagem enquanto o Salvador me contemplava a mim.

Salvador: Então... O que se passou? - deu iniciativa.
Joana: Tu sabes, porquê que perguntas?
Salvador: Para ter a certeza. Estás bem?
Joana: Parece-te que estou bem?
Salvador: Hum... Não, mas devias porque estar com o Grande Salvador.
Joana: Não sejas idiota.
Salvador: Não sou.
Joana: És sim.
Salvador: Vem cá. - agarra-me pela cintura e os nossos corpos reencontram-se de novo.
Joana: Diz...
Salvador: O que sentes?
Joana: ... A tua respiração.
Salvador: Não! O que sentes?
Joana: O meu corpo a estremecer, mesmo sabendo que ele não se está a mexer.
Salvador: Estas a pensar em alguém?
Joana: Não.
Salvador: E em algo?
Joana: Também não. - digo novamente.
Salvador: Então... - faz uma pausa. - Porquê que foges sempre?
Joana: Hum... - fiquei sem palavras. - Hum... - e o meu telemóvel começa a tocar.
Salvador: Atende. - disse e começou a afastar-se de mim.
Joana: 'Tou? Sara?
Sara: «Joana, onde te metes-te? Sabes que horas são? São 18:00h da tarde é melhor vires para ca... »
Joana: Boa, fiquei sem bateria.
Salvador: E agora?
Joana: Temos que ir acho que se passa algo. A Sara estava muito nervosa ao telefone. - começo a correr em direcção à estrada que ainda ficava um bocado longe. - AAAAAAAAH - grito ao mesmo tempo que cai no meio do chão.
Salvador: Joana. - veio a correr para me socorrer. - Estas bem? Magoaste-te?
Joana: Ai, o meu pé. - fazia uns grunhidos.
Salvador: Torceste-o?
Joana: Sim, dói tanto.
Salvador: Levanta-te. - ajuda-me a levantar.
Joana: Não consigo andar, aiiiii.- agarro-me a ele.
Salvador: Eu levo-te até casa.
Joana: És doido, de atrelado só se for.
Salvador: Não, assim. - pega-me ao colo e começa a andar.
Joana: Vais ficar todo dorido.
Salvador: Melhor que não. Ou queres ir a rastejar para casa?
Joana: Bem que arrogante.- Ele começa a rir-se.

  Ao decorrer do tempo, e depois de muito tempo de caminho para a vila, finalmente chegámos. Quando chegámos avistei a minha casa e vi que a Sara estava à minha espera nas escadas perto da entrada que dava á cozinha e perto da caixa do correio. E por falar em correio, ainda não escrevi ao Diogo, nem imagino o que lhe vou dizer. Tenho de pensar nisso com imensa calma, depois daquelas confissões... Se calhar mando-lhe uma mensagem para o Facebook.

Salvador: Vá, as melhoras princesa.
Joana: Adeus. - aproximo-me para lhe dar um beijo na bochecha, e vou em direcção à Sara ainda a coxiar um pouco.
Sara: Oh meu Deus, estás bem?
Joana: Isso pergunto eu. O que se passa? Eu notei na tua voz ao telemóvel.
Sara: Porquê que me desligaste o telemóvel na cara?
Joana: Fiquei sem bateria, tonta.
Sara. Ahh...
Joana: Vá conta-me.
Sara: Pensava que já te tinhas esquecido.
Joana: Óbvio que não. Conta-me, já estou a morrer por dentro.
Sara: Eu... E o T... -não diz mais nada.
Joana: Sim...
Sara: Beijámo-nos. - e quando eu comecei a fazer uma festa ela interrompeu-me. - Ele parou o beijo e disse para eu não repetir.
Joana: O quê?
Sara: Sim Joana, e agora? - eu não digo nada apenas abraço-a. - Quero voltar a casa uns dias, vens comigo?
Joana: Não sei.... - fiquei à nora.
Sara: Apanhamos o autocarro amanha de madrugada e não dizemos nada a ninguém, deixamos um bilhete e vamos para Almada, por favor amiga. Além disso, tu e o Ricardo estão assim e tu não deves suportar a Matilde cá.
Joana: Pois, mas assim o Ricardo vai pensar que sou uma cobarde e fugi, e mesmo assim deixá-lo aqui com aquela ave? Não sei o que fazer.
Sara: Por favor...
Joana: Vou pensar.

6 de fevereiro de 2012

XXIII

JOANA

   Estava a chegar a casa quando vi que à entrada da porta depois de subir as escadas estavam malas de viagem, com um aspeto feminino. A Sara não me disse nada que ia embora, esquisito. Entrei para espreitar, e ao passar a cozinha na sala estava a Matilde agarrada ao Ricardo. 

Joana: O que se passa aqui? - disse com uma certa raiva.
Ricardo: Joana... - interrompo-o.
Joana: Joana o quê? 
Ricardo: Convidei a Matilde para vir passar férias connosco.
Joana: Falaste com o T e com a Sara? - disse de um modo rude.
Ricardo: Não.
Joana: Boa Ricardo! - disse com imensa raiva e vontade de lhe bater.
Matilde: Joana, eu sei que não gostas de mim mas não é preciso vocês se chatearem por isto. - ingenuamente afirmou, olhando-me nos olhos.
Joana: Não é nada disso, só não gostei que não avisassem. - na verdade, não era bem isso.
Ricardo: Sabes, andas demasiado ocupada ou não te apetece estar comigo e com a Sara e com o T, não ouves nem sabes de nada, Joana. 
Joana: Esta conversa já está a cheirar mal. - afasto-me mas, antes de mais digo. - É se for assim também convido montes de gente e vem tudo para aqui sem mais nem menos. 
Ricardo: Sabes que não é bem assim. 
Joana: Sim, sim, sim... - fui de novo para a rua.

  E quando cheguei à estrada encontro o Salvador, pareceu estranho mas parece que me salvou o dia e me fez sentir melhor depois de toda aquela discussão. Estava com um skate e com a mala que costuma levar para fazer bodyboard. Lancei-lhe um olhar forte e intimidador, e ele fez um sorriso de galã.

Salvador: Não ias para casa sua tonta?
Joana: Parece que não.
Salvador: Que te fez mudar de ideias? - sorriu.
Joana: Uma pequena ... Não sei como dizer. 
Salvador: Ok, não interessa. - agarra-me pelo braço e leva-me para perto do seu corpo.
Joana: Não faças isso. - o meu coração palpitava.
Salvador: Tens medo de cair nos meus encantos?
Joana: Quais? Não conheço nenhum. - provoquei-o.
Salvador: Temos tempo para isso.
Joana: Ok, deixas-me doida. - excedi-me, completamente. 

E o Ricardo aparece à porta de casa com a Matilde...

Ricardo: Joana. - grita.
Joana: Que foi? - dou um sobressalto e afasto-me do Salvador.
Ricardo: Temos que falar. 
Joana: Não, não temos. Não quero falar contigo.

Ele não pronunciou mais nada e eu o Salvador seguimos em frente, sem destino.